Publicar na internet imagens com conteúdo de pedofilia é um crime de
competência federal, por ser um delito previsto em convenção
internacional assinada pelo Brasil e que pode ter repercussão
internacional — no caso, as fotos serem vistas por pessoas em outros
países. Com esse argumento, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal
Federal, divergiu do relator, Marco Aurélio, e convenceu a maioria do
Plenário a negar provimento ao Recurso Extraordinário 628624.
O RE
questionava o acórdão da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª
Região que determinou a competência da Justiça Federal para processar e
julgar a suposta prática do crime de publicação de imagens com conteúdo
pornográfico envolvendo adolescentes (artigo 241-A da Lei 8.069/1990 —
Estatuto da Criança e do Adolescente), quando cometidos na internet. O
argumento é que a matéria seria de competência da Justiça estadual, uma
vez que não existiria qualquer evidência de que o acesso ao material
pornográfico infantil, disponível na internet, tenha ocorrido fora dos
limites nacionais.
Relator como minoria
O relator da matéria, ministro Marco Aurélio, deu provimento ao recurso
extraordinário, considerando não haver tratado endossado pelo Brasil
prevendo o crime, mas apenas a ratificação do Brasil à Convenção sobre
os Direitos da Criança da Assembleia Geral das Nações Unidas. Ele
concluiu que a ausência de tratado específico confirmado pelo Brasil
impossibilita atribuir competência à Justiça Federal para julgar o fato.
Segundo
o ministro, o delito foi totalmente praticado no Brasil — início e
consumação — “porquanto, o material veio a ser inserido no computador
que se encontrava no país, não tendo sido evidenciado o envio ao
exterior, e a partir dessa publicação é que se procederam vários
acessos”. Dessa forma, ele votou no sentido de reformar o acórdão da 4ª
Turma do TRF-1, determinando a remessa do processo à Justiça estadual de
Minas Gerais. O voto do relator foi seguido pelo ministro Dias Toffoli.
Maioria
O ministro Edson Fachin abriu a divergência e foi seguido pela maioria
do Plenário. Ele negou provimento ao recurso extraordinário e entendeu
que a matéria é de competência da Justiça Federal, conforme disposição
contida no artigo 109, inciso V, da Constituição Federal.
Segundo
ele, há três requisitos essenciais e cumulativos para a definição da
competência da Justiça Federal na matéria: que o fato seja previsto como
crime em tratado ou convenção; que o Brasil seja signatário de
compromisso internacional de combate àquela espécie delitiva; e que
exista uma relação de internacionalidade entre a conduta criminosa
praticada e o resultado produzido (ou que deveria ter sido produzido).
“Do
exame que fiz, compreendi como preenchidos os três requisitos”,
ressaltou o ministro Edson Fachin. De acordo com ele, o Estatuto da
Criança e do Adolescente é produto de tratado e convenção internacional
subscrita pelo Brasil “exatamente para proteger as crianças dessa
prática nefasta e abominável que é a exploração de imagens na internet”.
“Esse
procedimento pedofílico, que merece obviamente repulsa, quer do ponto
de vista jurídico, quer do ponto de vista ético, tem o seu tipo previsto
na Lei 11.829/2008”, afirmou. Tal dispositivo prevê como crime
"oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou
divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática
ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de
sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente”.
Esse
tipo penal, conforme o ministro, decorre do artigo 3º, da Convenção
sobre os Direitos da Criança da Assembleia Geral da ONU, de 25 de maio
de 2000, texto que foi internalizado no Brasil pelo Decreto 5.007/2004.
Assim,
o ministro entendeu que a questão é de competência da Justiça Federal
ao considerar a amplitude global do acesso ao site no qual as imagens
ilícitas foram divulgadas, caracterizada, com isso, a internacionalidade
do dano produzido ou a potencialidade do dano. Nesse sentido, votaram
os ministros Luís Roberto Barroso, Teori Zavascki, Rosa Weber, Cármen
Lúcia, Gilmar Mendes, Celso de Mello e o presidente do STF, Ricardo
Lewandowski.
Fonte: STF